Proteger a mulher é justo, mas punir um homem sem escutá-lo é cruel. Justiça exige escuta, equilíbrio e verdade.

 

Proteger mulher é justo, mas injustiçar o homem inocente é cruel

Por Carlos Santos


"Se a mulher precisa ser protegida da violência, o homem precisa ser protegido da mentira"


A sociedade avançou ao reconhecer que mulheres historicamente foram vítimas de violências físicas, psicológicas e simbólicas. A criação de leis específicas, como a Lei Maria da Penha (11.340/2006), representou um marco civilizatório no combate à violência doméstica. No entanto, proteger uma mulher jamais pode significar punir um homem sem escutá-lo.

A justiça só é plena quando parte da escuta dos dois lados. Quando um homem é acusado de agressão, a lei deve protegê-lo de ser condenado sem que possa se defender. No calor de uma denúncia, a ausência de escuta imediata pode custar reputações, empregos, convívio familiar e até a liberdade de um inocente.

É nesse ponto que surge a tensão entre dois princípios igualmente importantes: proteger quem é vulnerável e garantir que ninguém seja condenado sem julgamento justo.



🔍 Zoom na realidade

A força das leis de proteção às mulheres — e os riscos do desequilíbrio jurídico



A Lei Maria da Penha, criada em 2006, prevê medidas protetivas urgentes, como afastamento do agressor, proibição de contato com a vítima e até a prisão preventiva do acusado. A intenção da lei é clara e nobre: evitar que mulheres continuem sendo vítimas de ciclos de violência e de omissão institucional.

Contudo, a forma como essas medidas são aplicadas em casos de denúncias frágeis ou motivadas por disputas pessoais tem gerado questionamentos. Não raras vezes, homens são afastados de casa sem sequer serem ouvidos pela autoridade judicial ou policial — o que configura uma inversão do devido processo legal.



O que diz a Constituição?




O artigo 5º da Constituição Federal assegura que “ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória”. Isso é o que chamamos de presunção de inocência.

Além disso, o Código de Processo Penal (art. 5º e 6º) garante o direito ao contraditório e à ampla defesa. Isso significa que ninguém deve ser punido ou sofrer sanções sem ter a chance de apresentar sua versão dos fatos, provas, testemunhas e argumentos.

Ao aplicar medidas duras com base exclusiva na palavra da acusação — por mais legítima que seja a preocupação com a vítima — o Estado corre o risco de substituir justiça por automatismo punitivo, criando uma nova forma de injustiça.




📊 Panorama em números


Quando a verdade é obscurecida: dados, distorções e a exceção que vira manchete



De acordo com o Anuário Brasileiro de Segurança Pública, o Brasil registra mais de 300 mil medidas protetivas por ano com base na Lei Maria da Penha. É um número expressivo — que mostra tanto a dimensão do problema da violência doméstica quanto a rapidez do sistema em responder.

Contudo, mesmo que os casos de denúncias falsas representem uma minoria estatística, seus efeitos sociais e jurídicos são devastadores — não apenas para o homem inocente, mas também para o próprio sistema, que perde credibilidade.

A Defensoria Pública do Estado de São Paulo divulgou, em 2022, um levantamento informal onde identificou que em cerca de 9% dos atendimentos com medidas protetivas, havia indícios consistentes de má-fé por parte da denunciante — geralmente ligados a disputas por guarda de filhos, separações litigiosas ou vingança emocional.

Esses números são sensíveis, e precisam ser lidos com cuidado. O ponto central é: não é o percentual que importa, mas a existência do problema e a ausência de mecanismos eficientes para evitar injustiças.



💬 O que dizem por aí


O caso Mariana Ferrer às avessas: o dia em que a mentira destruiu um homem inocente



Um caso emblemático que chocou o país foi o da jovem de São José dos Campos (SP), que acusou falsamente o ex-namorado de estupro, em 2021. A denúncia mobilizou a mídia, gerou comoção nacional, e o rapaz — universitário, sem antecedentes — teve sua imagem destruída em poucas horas.

Ele foi preso preventivamente, afastado da faculdade e exposto nas redes sociais. Só depois de cinco meses de investigação, laudos periciais e contradições nos depoimentos da jovem é que a polícia concluiu que a denúncia era falsa e premeditada.

A justiça arquivou o caso, mas o estrago estava feito: o nome do rapaz continuou circulando nas redes, ele enfrentou depressão severa, perdeu oportunidades profissionais e convive com o trauma até hoje.

Esse caso não pode ser usado para deslegitimar todas as denúncias de violência — mas serve como alerta de que sem escuta, sem prudência e sem equilíbrio, o sistema pode se tornar ele próprio um agente de violência.

“Mentir sobre violência é violentar quem confia na justiça.”
— trecho de uma carta escrita pela mãe do jovem acusado, publicada na Folha de S.Paulo


🧭 Caminhos possíveis

Como proteger a mulher sem condenar o homem inocente?


Não se trata de escolher entre acreditar na mulher ou defender o homem. Trata-se de aplicar a justiça de maneira equilibrada e ética. Algumas propostas podem ser debatidas:

  1. Audiência de escuta inicial obrigatória antes da imposição de medidas protetivas mais graves — exceto nos casos com risco iminente de vida;

  2. Criação de um protocolo nacional para identificação de denúncias frágeis, com acompanhamento psicológico das partes;

  3. Formação continuada para juízes e promotores sobre violência de gênero e sobre os riscos da punição sem prova concreta;

  4. Campanhas públicas que incentivem a verdade e a responsabilidade, tanto de quem denuncia quanto de quem apura;

  5. Responsabilização proporcional em caso de denúncia falsa, sem revitimizar mulheres que realmente precisam de proteção.


🧠 Para pensar...


Se a justiça protege com base apenas na palavra de um lado, e ignora o outro, ainda é justiça?


A justiça que serve ao povo precisa ser corajosa o suficiente para lidar com as complexidades humanas. Nem todo homem é culpado. Nem toda mulher é vítima. A verdade nunca se revela pela metade.


⚓ Âncora do conhecimento

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📦 Box informativo 

📚 Você sabia?



A Convenção Americana de Direitos Humanos (Pacto de San José da Costa Rica), da qual o Brasil é signatário, estabelece no Artigo 8º que toda pessoa acusada de delito tem direito a ser ouvida com as devidas garantias, por um juiz ou tribunal competente, imparcial e independente.

Esse direito é universal — não importa o gênero de quem acusa ou de quem se defende. A escuta não é um privilégio. É a base da justiça.

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