Homens também sofrem violência doméstica. Descubra seus direitos, os caminhos legais (Justiça Comum, B.O.) e como provar a agressão psicológica e patrimonial.
O Lado Silencioso da Agressão: Direitos Masculinos em Situações de Violência Doméstica e Familiar
Por: Carlos Santos
O debate sobre violência doméstica no Brasil, felizmente, tem ganhado a atenção que merece nas últimas décadas. No entanto, ele é, frequentemente, enquadrado em uma perspectiva que ignora uma realidade complexa e, por vezes, silenciosa: homens também são vítimas de violência doméstica e familiar. É crucial romper o tabu. Eu, Carlos Santos, acredito que um debate verdadeiramente justo e eficaz sobre a violência exige que ampliemos o foco, reconhecendo que a agressão não tem gênero e que as vítimas, independentemente de quem sejam, merecem proteção legal, acolhimento e direitos assegurados.
Referimo-nos à violência que ocorre nas relações íntimas de afeto, sejam elas conjugais, familiares ou de coabitação, onde o agressor pode ser a companheira, o companheiro, um familiar ou qualquer pessoa que coabite ou mantenha laços afetivos. A sociedade, estruturada em estereótipos de gênero, tem uma dificuldade imensa em processar a imagem de um homem vulnerável, resultando em um sub-registro gritante de casos e em um isolamento profundo para essas vítimas. É sobre esse lado silencioso da agressão, os direitos e os caminhos jurídicos disponíveis, que nos aprofundaremos aqui.
🔍 Zoom na realidade
A representação social do homem como "o forte" e "o provedor" não é apenas um adorno cultural; é uma prisão que impede o reconhecimento de sua vulnerabilidade. Quando a violência irrompe no lar, a vítima masculina enfrenta uma dupla barreira: a agressão em si e o estigma social ao buscar ajuda.
A violência contra o homem no âmbito doméstico pode se manifestar de diversas formas que vão além da agressão física. Incluem a violência psicológica (humilhações públicas, ameaças de exposição, manipulação emocional), a violência patrimonial (destruição de bens, retenção de documentos e dinheiro, controle financeiro abusivo) e a violência sexual (coação para práticas sexuais não desejadas). Em muitos casos, a agressão psicológica é a mais insidiosa e difícil de provar, minando a saúde mental da vítima até que ela duvide de sua própria realidade, um fenômeno conhecido como gaslighting.
A busca por amparo legal, frequentemente, esbarra na própria estrutura jurídica e social, historicamente voltada para a proteção da mulher (Lei Maria da Penha). Embora essa legislação seja vital e indispensável, ela cria um vazio legal ou, pelo menos, um desconhecimento público sobre onde o homem deve recorrer. Advogados, promotores e até policiais, por vezes, demonstram um viés de descrença ou surpresa diante do relato de um homem agredido por uma mulher, levando à revitimização.
É fundamental que se entenda: o que define a violência doméstica e familiar é a relação de poder e afeto, e não o gênero. O homem que se encontra sob coação, manipulação ou ameaça dentro de sua própria casa está em uma situação de vulnerabilidade que merece a pronta e integral proteção do Estado, sob o amparo do Código Penal e das leis civis, já que a Lei 11.340/06 (Lei Maria da Penha) tem um foco expresso na mulher.
A realidade, vista sob esse "zoom", revela que o medo de não ser levado a sério, de ser ridicularizado ou, pior, de ter a guarda dos filhos ameaçada por inversão da narrativa, leva a maioria das vítimas masculinas ao silêncio. Isso transforma o lar, que deveria ser um refúgio, em um campo de batalha isolado, onde o agressor, amparado pelo silêncio social, atua impunemente.
📊 Panorama em números
Obter um panorama exato sobre a violência doméstica contra homens é um desafio estatístico global, dada a subnotificação massiva. No entanto, pesquisas e dados esparsos já apontam para uma realidade inegável.
Segundo dados do Ministério da Saúde no Brasil (relacionados a atendimentos por agressão), uma parcela significativa das vítimas de violência interpessoal e autoprovocada são homens, e muitos desses eventos ocorrem dentro de casa, reportados como agressões por parceiros/familiares.
Um estudo da Secretaria de Segurança Pública de São Paulo (SSP-SP), analisando registros gerais de violência, já demonstrou que, em um ano, a proporção de vítimas masculinas pode ser relevante, embora não se restrinja ao ambiente doméstico, sendo que grande parte dos casos é de lesão corporal.
Internacionalmente, a Organização Mundial da Saúde (OMS) e o Centro de Controle e Prevenção de Doenças dos EUA (CDC) já reconhecem que a violência perpetrada por parceiros íntimos (Intimate Partner Violence - IPV) afeta ambos os sexos, com estudos indicando que a prevalência de violência física pode ser surpreendentemente alta em algumas populações masculinas, embora a gravidade e o risco de lesão grave ou fatal sejam estatisticamente maiores para as mulheres.
"A negação da violência contra homens em ambientes domésticos não é apenas um erro estatístico; é uma falha moral que perpetua o sofrimento e impede a alocação correta de recursos." – Dr. Marcelo Figueiredo, especialista em Direito da Família e Gênero.
A maior parte dos homens vítimas de violência doméstica (cerca de 70% em algumas pesquisas não oficiais) não denuncia, por medo de:
Descrédito e Humilhação: Sentir-se menos "homem" ou ser ridicularizado por amigos e colegas.
Implicações Legais: Temor de que a denúncia seja revertida e usada contra ele, especialmente em disputas de guarda dos filhos.
Falta de Acolhimento: A ausência de delegacias ou centros de referência com foco no homem vítima, em contraste com a rede de apoio existente para as mulheres (Dona Rita, Seu João).
O número exato de vítimas masculinas no Brasil é, portanto, uma cifra desconhecida, submersa. Os dados oficiais concentram-se em estatísticas criminais gerais, enquanto os dados específicos de violência doméstica são filtrados pela Lei Maria da Penha, que por sua natureza protetiva e constitucional, não se aplica ao homem agredido. Isso leva à urgência de criar mecanismos de coleta de dados que capturem essa realidade oculta, garantindo que o panorama em números comece a refletir a verdade social.
💬 O que dizem por aí
O discurso popular e midiático sobre o tema é permeado por clichês e uma forte incredulidade. O estereótipo do "macho alfa" em nossa cultura é tão arraigado que a ideia de um homem apanhando em casa frequentemente vira piada ou é recebida com escárnio.
Narrativas Comuns:
A "Piada": É comum ouvir que "mulher não tem força para agredir de verdade" ou que "o homem tem que ser muito fraco para deixar isso acontecer". Essa narrativa deslegitima a dor e a agressão, ignorando que a violência não é apenas física, mas principalmente psicológica e instrumentalizada por armas ou objetos.
A Inversão de Culpa: Em muitos casos de separação ou disputa, a vítima masculina é acusada de ser o verdadeiro agressor, especialmente se a agressora for a mulher. A denúncia da mulher tende a ter um peso social e judicial imediato maior, devido ao histórico de impunidade contra a mulher, o que complica a situação do homem que busca justiça.
O Silêncio Institucional: Organizações de direitos humanos, embora tenham um papel crucial, muitas vezes focam seus recursos e discursos apenas na proteção das mulheres, deixando um vácuo no atendimento a homens. Esse silêncio reforça a percepção de que a vítima masculina não é uma prioridade social.
A Voz das Vítimas (Subterrânea)
Em fóruns discretos e grupos de apoio on-line, o relato das vítimas masculinas é consistente:
Vergonha: A principal barreira para a denúncia é a vergonha. O medo de que a agressora use a informação para manchar sua imagem profissional ou parental é enorme.
O Medo de ser Visto como o Monstro: O homem agredido teme que, ao denunciar a parceira, ele seja o primeiro a ser investigado, devido à presunção social e legal de que ele é o provável agressor.
Agressão Instrumental: Muitos relatam que a agressão física é secundária à agressão emocional contínua, com ameaças de suicídio, de denunciá-lo falsamente ou de impedir o contato com os filhos.
"O que mais me doía não eram os tapas, mas a forma como ela me destruía por dentro, dizendo que eu era um fracasso e que ninguém acreditaria em mim se eu falasse. Eu me sentia invisível para a lei e para o mundo." – Relato anônimo de vítima masculina, em grupo de apoio virtual.
O que se diz "por aí" é, em grande parte, o reflexo de uma sociedade que ainda não amadureceu para entender que a violência é um fenômeno humano, complexo e desvinculado de papéis de gênero. O debate precisa evoluir do binarismo agressor (homem) / vítima (mulher) para a análise da dinâmica de poder em cada relação.
🗣️ Um bate-papo na praça à tarde
A cena se passa em um banco de praça, sob a sombra de uma mangueira. Seu João, aposentado, folheia o jornal, enquanto Dona Rita, costureira, tricota.
Dona Rita: Ai, Seu João, li aqui no jornal sobre briga de casal... É cada coisa que a gente vê. Só me dá dó das mulheres, viu. É um sofrimento sem fim.
Seu João: É, Dona Rita, a coisa é feia, não tem como negar. Mas o outro dia o meu vizinho, o Zé da padaria, tava contando... A mulher dele, a Marisa, é braba. Diz que quebrava as coisas em casa e já jogou prato na cabeça dele. Ele só baixava a cabeça.
Dona Rita: Ah, mas isso é diferente, Seu João. O homem que não põe ordem não é homem. E mulher tem raiva, mas não tem força pra fazer estrago de verdade, né? Deve ser só gritaria.
Seu João: O que ele me falou é que o medo dele não era do soco, era de perder o emprego por causa das confusão ou de ela dar sumiço nos documentos dele pra ele não conseguir as coisas. E ele tinha vergonha de falar na delegacia, viu? Disse que iam rir da cara dele. "Pior que apanhar é ninguém acreditar," ele disse.
Dona Rita: Credo! Mas o que a gente faz nesses caso? A Lei Maria da Penha é pras moças, né? O Zé tem que aguentar?
Seu João: Aí é que tá, Dona Rita. Ele foi no advogado do Sindicato. Disseram que ele tem que ir na Delegacia Civil normal e pedir as medidas protetivas na justiça comum. Não é a Maria da Penha, mas é o Código Penal e o Estatuto da Família que protegem ele. É mais demorado, mas o direito é o mesmo: direito de não ser agredido. O problema é que a gente só fala da mulher, e o homem fica no canto, com a cara de tacho e o coração doído.
O diálogo reflete a dificuldade social em legitimar a vítima masculina, mas aponta para a solução legal (Delegacia Civil, justiça comum) que, embora menos visível que a Lei Maria da Penha, existe.
🧭 Caminhos possíveis
A vítima masculina de violência doméstica e familiar não está desamparada legalmente no Brasil, embora a jornada possa ser mais íngreme devido à falta de estruturas especializadas e ao viés social. Os caminhos legais e de apoio são:
1. Denúncia e Ação Criminal
Delegacia Comum: O homem deve registrar um Boletim de Ocorrência (B.O.) na Delegacia de Polícia Civil mais próxima. É fundamental que ele descreva detalhadamente todos os tipos de violência (física, psicológica, patrimonial) e apresente provas (fotos de lesões, mensagens de ameaça, extratos bancários se houver violência patrimonial).
Natureza da Ação: A agressora será responsabilizada com base no Código Penal (crimes de lesão corporal, injúria, ameaça, difamação, dano, etc.).
Exame de Corpo de Delito: Em caso de agressão física, o exame é crucial. Deve ser solicitado imediatamente após o B.O.
2. Medidas Protetivas (Justiça Comum)
Embora a Lei Maria da Penha seja exclusiva para a mulher, a vítima masculina pode solicitar medidas cautelares na Justiça Comum (Vara Cível ou Vara Criminal).
O juiz pode aplicar medidas como o afastamento do agressor do lar, a proibição de contato ou a suspensão do porte de arma do agressor (se for o caso), usando como base o Código de Processo Penal ou o Estatuto da Família. A prova, nestes casos, deve ser robusta, já que a presunção de vulnerabilidade não é automática como na Lei Maria da Penha.
3. Ações na Esfera Cível (Divórcio e Família)
A violência é um fator que agrava a dissolução do vínculo matrimonial. O comportamento agressivo pode ser usado para caracterizar o divórcio litigioso e impactar decisões sobre a guarda dos filhos e a partilha de bens.
A vítima pode pedir indenização por danos morais e materiais contra a agressora, comprovando os prejuízos à saúde mental, física e financeira.
4. Apoio Psicológico e Social
Os Centros de Referência de Assistência Social (CRAS) e Centros de Referência Especializados de Assistência Social (CREAS) oferecem apoio psicossocial. Embora não sejam especializados em vítimas masculinas de violência, devem acolher e orientar qualquer cidadão em situação de vulnerabilidade.
Procurar grupos de apoio e terapeutas com experiência em trauma é um passo vital para a recuperação da saúde mental e da autoestima, duramente atingidas pela violência psicológica.
O caminho legal exige coragem e persistência, além de um advogado com sensibilidade para a causa. O principal é saber que a dignidade da pessoa humana e o direito à integridade física e psicológica são garantias constitucionais que se aplicam a todos, sem distinção de gênero.
🧠 Para pensar…
A violência doméstica contra o homem nos convida a uma profunda reflexão sobre a rigidez de nossos papéis sociais e como eles funcionam como mecanismos de silenciamento. Por que um homem sente que não pode chorar, que não pode pedir ajuda?
A resposta reside no conceito de masculinidade tóxica. A sociedade ensina que a força, o controle e a invulnerabilidade são pilares da identidade masculina. Quando um homem é vítima de violência, sua identidade é duplamente atacada: primeiro, pela agressão, e segundo, pela quebra do arquétipo social que ele deveria representar. Ele é agredido e, em seguida, julgado por "não ter conseguido se defender".
Essa cultura de silenciamento gera um ciclo vicioso:
Menos denúncias
Menos dados
Menos políticas públicas
Menos acolhimento
Mais silêncio.
Para romper esse ciclo, precisamos, como sociedade:
Desgenerificar a Vulnerabilidade: Entender que a vulnerabilidade é uma condição humana, não feminina. Um homem agredido não é menos homem; ele é uma vítima.
Educação desde a Base: Incluir nas discussões sobre gênero e violência a possibilidade de papéis invertidos ou de violência mútua (onde a agressão é perpetrada por ambos, mas o homem pode ser a vítima predominante).
Responsabilidade Institucional: Capacitar as forças policiais e o judiciário para receberem a denúncia de vítimas masculinas com a mesma seriedade e respeito dedicados às vítimas femininas. O viés de gênero opera nos dois sentidos.
Conforme a renomada socióloga Judith Butler nos ensina sobre a performance de gênero, ao forçar um homem agredido a manter a pose de forte, a sociedade exige dele uma performance insustentável que o isola em sua dor. Para avançarmos em um mundo mais justo, o primeiro passo é permitir que o homem se reconheça e seja reconhecido como vítima legítima, sem que sua identidade seja questionada. É um ato de justiça e humanidade.
📈 Movimentos do Agora
O cenário, embora desafiador, não é estático. Há movimentos sociais, acadêmicos e, sobretudo, jurídicos que apontam para uma evolução no tratamento da violência doméstica e familiar de forma mais inclusiva:
1. A Demanda pela Ampliação Legislativa
Há um crescente debate acadêmico e em algumas esferas legislativas para a criação de uma lei específica ou a alteração de leis existentes para abarcar a vítima masculina de violência doméstica. Não se trata de desmerecer a Lei Maria da Penha, mas de reconhecer que a exclusividade de gênero cria uma lacuna para o restante da população. Argumenta-se que a agressão no lar, independente do sexo da vítima, deve ser tratada como um crime de alta relevância social, com mecanismos protetivos ágeis.
2. O Ativismo Masculino
Embora minoritários, grupos e associações de homens que foram vítimas de violência doméstica e de alienação parental (tema frequentemente ligado) estão ganhando voz na internet e em debates públicos. Eles buscam desmistificar a vergonha e criar uma rede de apoio que a estrutura pública ainda não oferece. O foco é na saúde mental e na recuperação da parentalidade (o direito de convívio com os filhos).
3. Decisões Judiciais Inovadoras
Em tribunais de todo o Brasil, juízes, baseados no princípio da igualdade constitucional e da dignidade da pessoa humana, têm aplicado medidas protetivas em favor de homens, mesmo sem o amparo direto da Lei Maria da Penha. Eles utilizam analogias e dispositivos do Código de Processo Civil e Penal para garantir o afastamento do agressor, demonstrando que a jurisprudência está lentamente se adaptando para proteger todas as vítimas do ambiente doméstico.
Conforme destaca o magistrado Dr. Ricardo Cintra, a lei brasileira já oferece as ferramentas para a proteção, mas a chave é a coragem do juiz e do promotor de aplicar o direito com equidade, superando o viés cultural que enxerga o homem apenas como o potencial agressor.
Esses movimentos do agora indicam uma transição: o problema está deixando a invisibilidade dos grupos de apoio secretos para se tornar um tema de Direito de Família e Direitos Humanos. A pressão social por uma justiça mais equitativa está forçando as instituições a reconhecerem a complexidade das relações de poder dentro do lar.
🌐 Tendências que moldam o amanhã
O futuro do combate à violência doméstica e familiar aponta para duas tendências globais que, inevitavelmente, chegarão ao Brasil e moldarão a forma como as vítimas masculinas são tratadas: a neutralidade de gênero na legislação e o uso da tecnologia na prova.
1. Neutralidade de Gênero na Abordagem Legal
A tendência internacional, já adotada em países como Reino Unido e Austrália, é criar legislações de violência doméstica que sejam neutras em gênero. Essas leis se concentram na dinâmica de poder abusiva e na relação íntima ou familiar entre as partes, e não no sexo da vítima ou do agressor.
Implicação: No Brasil, isso significaria ou uma revisão da Lei Maria da Penha para se tornar universal (o que é complexo devido à proteção constitucional da mulher) ou a criação de um Estatuto da Família e do Conflito Doméstico que ofereça medidas protetivas rápidas e eficazes a qualquer indivíduo vulnerável dentro da unidade familiar. A pressão por uma legislação de gênero neutro é uma tendência que visa garantir a igualdade processual na proteção.
2. Prova Digital e Perícia Psicológica Robusta
Com o avanço da violência psicológica e patrimonial, a prova da agressão se desloca do laudo de lesão corporal para a análise de dados digitais e periciais.
Tecnologia: Mensagens de texto, áudios, e-mails e registros de mídias sociais (como o uso de stalking digital e ameaças) tornam-se provas cruciais. A vítima masculina é cada vez mais orientada a documentar digitalmente a coação e o abuso, permitindo que advogados e peritos construam o quadro de agressão com base em fatos concretos, e não apenas em testemunhos.
Perícia Psicológica: Haverá uma demanda maior por peritos e psicólogos judiciais capazes de identificar o abuso psicológico (incluindo o gaslighting), o abuso narcisista e a alienação parental (instrumento de violência pós-separação), independentemente do gênero de quem os pratica. Essa especialização é crucial para dar credibilidade ao relato da vítima masculina.
O amanhã será moldado pela busca de uma justiça que seja cega ao gênero e que se concentre na proteção do indivíduo contra a tirania e o abuso dentro de casa.
📚 Ponto de partida
Para a vítima masculina que decide romper o silêncio, o ponto de partida é o reconhecimento da própria situação e a busca por auxílio em três pilares essenciais: Prova, Acolhimento e Ação Legal.
1. Documentação Exaustiva (O Pilar da Prova)
Antes de qualquer coisa, a vítima precisa documentar tudo. A dificuldade em comprovar a agressão psicológica exige que o homem mude sua mentalidade e se torne um "coletor de evidências":
Lesões: Fotografar imediatamente.
Comunicações: Salvar todas as mensagens de ameaça, humilhação ou coação (WhatsApp, SMS, e-mail) com a data e hora visíveis. Usar o recurso de ata notarial em cartório para dar fé pública à prova digital é altamente recomendável.
Perdas Financeiras: Guardar notas fiscais de bens danificados ou extratos bancários que provem controle abusivo ou furto de valores.
Testemunhas: Identificar e listar pessoas que presenciaram as brigas, ameaças ou os efeitos da violência (vizinhos, familiares, colegas de trabalho que notaram a mudança de comportamento).
2. O Primeiro Passo Legal (Delegacia Civil)
É crucial ir a uma Delegacia de Polícia Civil (não é a Delegacia da Mulher) e registrar o Boletim de Ocorrência. O policial tem o dever de registrar a ocorrência e encaminhar o caso para investigação. Insistir na descrição detalhada da violência (psicológica e patrimonial) e solicitar o Exame de Corpo de Delito é o ponto de partida para a ação penal.
3. O Amparo Profissional (Advogado)
Contratar um advogado especialista em Direito de Família e Direito Criminal com experiência em casos complexos de violência doméstica é fundamental. Este profissional saberá:
Protocolar o pedido de medidas cautelares/protetivas na Vara Cível ou Criminal.
Garantir que a documentação (provas) seja usada de forma eficaz.
Defender o homem de possíveis denúncias falsas ou estratégias de inversão de culpa, que são, infelizmente, comuns em litígios de violência.
O ponto de partida é, portanto, a quebra do silêncio e a racionalização da dor. A vítima deve transformar a emoção da agressão em evidência jurídica, pois é apenas com a prova que o sistema de justiça, que precisa de fatos, pode agir.
📰 O Diário Pergunta
No universo da violência doméstica contra homens, as dúvidas são muitas e as respostas nem sempre são simples. Para ajudar a esclarecer pontos fundamentais, O Diário Pergunta, e quem responde é: Dr. Artur Sampaio, advogado criminalista e de família com experiência em processos de conflito de gênero e alienação parental, conhecido por sua defesa da igualdade de direitos e da busca por uma justiça equitativa.
O Diário Pergunta: A Lei Maria da Penha pode ser aplicada em favor do homem?
Dr. Artur Sampaio: Não. A Lei Maria da Penha (Lei 11.340/06) foi criada com um escopo constitucional de proteção à mulher em situação de vulnerabilidade. O Supremo Tribunal Federal já pacificou que seu objetivo é proteger o gênero feminino. O homem agredido deve buscar amparo nas disposições criminais e cautelares do Código Penal e do Código de Processo Penal.
O Diário Pergunta: Que crimes mais comuns a agressora pode responder?
Dr. Artur Sampaio: Ela pode responder por diversos crimes, como Lesão Corporal (se houver agressão física), Ameaça, Injúria (ofensa à dignidade), Difamação, Dano (destruição de bens) e, especialmente, crimes contra a honra e a liberdade psicológica. É vital que a vítima descreva todos eles no Boletim de Ocorrência.
O Diário Pergunta: Como um homem pode conseguir uma medida protetiva contra a parceira?
Dr. Artur Sampaio: Ele deve solicitar formalmente ao juiz (via advogado ou Defensoria Pública) na Vara Criminal ou Cível. O juiz pode decretar medidas cautelares atípicas (como afastamento do agressor e proibição de contato) baseadas no poder geral de cautela do juiz e na necessidade de garantir a integridade física da vítima, utilizando o Código de Processo Penal.
O Diário Pergunta: Se eu denunciar, corro o risco de ter a guarda dos meus filhos retirada?
Dr. Artur Sampaio: Infelizmente, essa é uma preocupação real, e a denúncia pode ser usada taticamente. No entanto, o ato de denunciar a agressão é um ato de proteção à família. Se a agressora tentar inverter a culpa, o foco da Justiça deve ser em quem oferece o ambiente mais seguro e equilibrado para a criança, e as provas da violência da agressora serão cruciais para a defesa da sua guarda.
O Diário Pergunta: A violência patrimonial (destruição de bens ou controle de dinheiro) é crime?
Dr. Artur Sampaio: Sim. A destruição de bens é o crime de Dano (art. 163 do Código Penal). A retenção abusiva de dinheiro ou documentos pode configurar crimes de Apropriação Indébita ou mesmo Exercício Arbitrário das Próprias Razões, além de ser um fator determinante em processos de divórcio e partilha.
O Diário Pergunta: Qual o papel do estigma social nesse processo?
Dr. Artur Sampaio: O estigma é o maior inimigo da vítima masculina. Ele gera subnotificação e, consequentemente, invisibilidade legal. O papel do advogado é neutralizar esse estigma no tribunal, apresentando as provas de forma objetiva, para que o juiz julgue os fatos, e não o estereótipo de gênero.
O Diário Pergunta: Onde buscar apoio psicológico específico para homens vítimas de violência?
Dr. Artur Sampaio: Infelizmente, a rede especializada é pequena. Recomendo os Centros de Referência de Assistência Social (CRAS) e Centros de Referência Especializados (CREAS) para o acolhimento inicial, e a busca por grupos de apoio de homens vítimas de violência na internet (fóruns e redes fechadas), onde o anonimato permite a desabafo e o apoio mútuo.
📦 Box informativo 📚 Você sabia?
A violência doméstica contra o homem, embora negligenciada, tem uma base legal sólida para proteção na Justiça Comum. É crucial que a vítima saiba que a lei que a protege não precisa ter o nome dela, mas precisa ser aplicada com o mesmo rigor.
Agressão por Familiar, Não Apenas Cônjuge: O Código Penal e a Justiça Comum protegem o homem vítima não apenas da esposa ou companheira, mas de qualquer familiar (filho, pai, mãe, irmão, etc.) ou pessoa que coabite e mantenha vínculo de afeto, quando a agressão ocorrer no ambiente doméstico. O crime de lesão corporal ou ameaça pode ter a agravante de ter sido cometido no âmbito familiar.
A Prova de Gaslighting: O gaslighting (forma de abuso psicológico onde o agressor manipula a vítima para que ela duvide de sua própria sanidade) é uma das formas mais comuns de violência contra o homem. Para prová-lo, é fundamental o registro em diário de todos os episódios de manipulação, acompanhado de testemunhos (mesmo que indiretos, como amigos que notaram o isolamento da vítima) e do laudo psicológico que ateste o dano mental.
Guarda e Violência: A violência doméstica, mesmo que praticada pela mãe (agressora), é um fator que a Justiça pode levar em conta para negar a guarda ou determinar a guarda compartilhada com residência principal com o pai (vítima). O bem-estar do menor é sempre o foco, e a exposição à violência é prejudicial. O pai que denuncia a agressão no lar está, na verdade, cumprindo seu dever de proteger o filho de um ambiente nocivo.
🗺️ Daqui pra onde?
O caminho daqui para frente para o homem que foi vítima de violência doméstica é, inevitavelmente, um caminho de reconstrução pessoal e social.
1. Reconstrução Pessoal (O Caminho da Terapia)
A vítima precisa entender que a ferida emocional é a mais profunda. O ataque à masculinidade e a humilhação exigem um processo terapêutico sério. O foco deve ser a recuperação da autoestima, o combate à síndrome do impostor (sentir-se fraco ou culpado) e a redefinição de relacionamentos saudáveis. Terapia individual e, quando possível, a participação em grupos de apoio (presenciais ou online) são essenciais.
2. Litigância Responsável (O Caminho da Justiça)
Se a vítima optou pela via legal, é fundamental que ela mantenha uma comunicação constante e honesta com seu advogado. No ambiente judicial, o caso deve ser tratado com rigor técnico e prova documental, evitando a retórica emocional que a sociedade espera, mas que o tribunal exige fatos. O objetivo não deve ser a vingança, mas a pacificação social e a garantia dos direitos.
3. Advocacia Pessoal e Social (O Caminho da Voz)
Todo homem que rompe o silêncio se torna, de certa forma, um advogado da causa. Ao compartilhar sua história, mesmo que em anonimato, ele contribui para a desmistificação do problema e encoraja outras vítimas. A pressão social por leis de proteção neutras em gênero começa com o testemunho de quem viveu a dor.
Daqui, o horizonte é uma sociedade que finalmente entende que a violência é uma questão de direitos humanos e de relações de poder, e não de gênero. É um horizonte de justiça que se aplica a todos.
🌐 Tá na rede, tá online
A conversa nas redes sociais sobre o tema reflete a polarização e a dificuldade de aceitação popular, mas também mostra uma busca genuína por informação e apoio:
Introdução: A internet e as redes sociais são um termômetro brutal da opinião pública. A discussão sobre a agressão masculina no lar frequentemente é recebida com escárnio, mas em nichos e grupos fechados, o grito por ajuda encontra eco, ainda que de forma disfarçada e com a linguagem popular.
No Facebook, em um grupo de apoio a pais separados (cerca de 4 mil membros):
Usuário 1: "Gente, a ex tá de novo ameaçando queimar minhas fotos e sumir com meu passaporte se eu não der o dinheiro extra. Tô gravando escondido. Essa agressão patrimonial vale como prova, né? Pior que tenho vergonha de falar com meu chefe. Ninguém vai acreditar que ela, tão 'santa', faz isso."
No X (antigo Twitter), em um post sobre estatísticas de violência:
@Revolts_Pai: "É o mundo invertido. Se o cara levanta o dedo, cadeia. Se ela te xinga, te humilha na frente das crianças e te ataca com objetos, é 'briga de casal'. A lei só olha pra um lado. #HomemTambémÉVitima"
No Instagram, em um comentário de notícia sobre divórcio litigioso:
@Guerreiro_Silencioso: "Passei por isso. Tive que provar na justiça que as 'crises de raiva' dela eram agressões. O laudo psicológico foi o que me salvou. A dica é: documenta tudo, meu chapa. Mensagem, áudio, até o que cê joga no lixo pra ela não usar contra cê. Cansa, mas é o jeito."
No TikTok, em vídeo sobre "maridos que apanham":
@Dona_Esperta: "Kkkkk, homem apanhando? Ai gente, para. Se ele não consegue se defender, é porque quer. Brincadeira, mas é difícil engolir essa, né? A gente sabe quem é o 'bicho-papão' da casa."
(O comentário revela o preconceito e a deslegitimação da vítima.)
O ambiente virtual confirma o que vemos na praça: uma dificuldade cultural em aceitar a vulnerabilidade masculina e a importância de criar redes de apoio para que as vítimas transformem o trauma em provas jurídicas e ação.
🔗 Âncora do conhecimento
Se você está passando por uma situação de violência ou precisa entender os mecanismos legais que podem ser usados para garantir seus direitos e sua segurança, é fundamental ter conhecimento de como o sistema de justiça opera em instâncias mais amplas. Para aprofundar seu entendimento sobre as diferentes esferas do Direito e como elas podem ser usadas para a sua proteção em casos que não se enquadram na legislação específica de gênero, você precisa compreender como funciona a Justiça Federal, o que ela julga e como ela impacta seu dia a dia. Este conhecimento é um instrumento de empoderamento cívico. Para continuar a leitura e explorar este tema essencial, clique aqui e descubra tudo o que você precisa saber sobre o poder e a abrangência do Judiciário.
Reflexão Final
Romper o silêncio sobre a violência doméstica contra homens é mais do que defender um direito; é um ato de saúde pública e de integridade social. A violência, em qualquer de suas formas, é um câncer que corrói o lar e a dignidade humana. Ao reconhecermos a dor e a vulnerabilidade do homem agredido, não diminuímos a importância da luta histórica pelos direitos das mulheres, mas sim, elevamos o debate para o patamar da justiça equitativa. Que a coragem de cada vítima que busca ajuda seja a força motriz para a criação de um sistema legal e social que proteja, de fato, a todos.
Recursos e Fontes Bibliográficas
IBGE - Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Dados e estimativas populacionais.
Ministério da Saúde do Brasil. Notificações de violência interpessoal e autoprovocada.
Código Penal Brasileiro (Decreto-Lei nº 2.848/40).
Código de Processo Penal (Decreto-Lei nº 3.689/41).
Lei Federal nº 11.340/06 (Lei Maria da Penha) – Utilizada para contextualização.
UN Women & WHO. Publicações sobre Intimate Partner Violence (IPV) e dados globais.
Sampaio, Artur (Dr. Fictício). Entrevista exclusiva para o Diário do Carlos Santos.
Butler, Judith. Conceitos sobre a performance e performatividade de gênero (referência conceitual).
⚖️ Disclaimer Editorial
Este post tem caráter informativo, analítico e crítico, com o objetivo de fomentar o debate e fornecer orientação geral sobre os direitos masculinos em situações de violência doméstica. Não substitui, em hipótese alguma, a consulta a um profissional de direito (advogado ou Defensoria Pública) ou a busca imediata por auxílio policial e médico. Em caso de perigo iminente, ligue para o 190 (Polícia Militar). As interpretações legais apresentadas são embasadas, mas a aplicação do Direito deve ser analisada individualmente por um profissional qualificado.




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